Insípida está a minha escrita,
desprovida de qualquer sentimento,
a emoção ficou proscrita,
não há espaço para nenhum tormento.
Sai porque tem de sair,
porque me faz falta praticar,
nada sei o que está para vir,
nada existe que seja para ficar.
Perdi a paixão que me alimentava a fluidez,
deixei o sentir fora de alcance,
agora escrevo com timidez,
já não sei falar sobre romance.
É um exercício novo,
escrever sem interiorizar,
passei a fazer parte do grande povo,
que para escrever tem de inventar.
Será que isto vai correr bem,
que se vai perceber o que quero dizer,
não ficarão as expetativas aquém,
continuarão a visitar-me se eu não sofrer?
Tenho muitas interrogações,
mas não posso sofrer só porque quero,
um dia já arrastei multidões,
que me queriam ajudar no meu desespero.
Agora é a vez de estarmos em paz,
de escrevermos de ânimo leve,
cedo ou tarde sempre se é capaz,
negar isso ninguém se atreve.
Há momentos muito complicados,
há situações que demoram mais a passar,
todos, um dia, estivemos desesperados,
todos, um dia, nos tornamos a levantar.
Tudo é uma questão de tempo,
o tempo que eu recusava aceitar,
naquela altura estava em sofrimento,
não tinha mais nada em que acreditar.
Mas o tempo tudo resolve,
mesmo que não o aceitemos de imediato,
a vida é cíclica, tudo nos devolve,
pouco a pouco vai acabando o teatro.
Insípida está a minha escrita,
desprovida de penoso afeto,
hoje sinto-me uma mulher rica,
que abraçou um novo projeto...
(Mafalda)
