Não te vou ler nenhum poema,
Não vou recordar nada em especial,
Vou tentar que a minha mão não trema
Quando chegar o momento final.
Não vou dizer palavras sentidas
Pois tudo seria demasiado repetitivo,
Fiz em vida as minhas despedidas
E tu sabes como funciona este coração enegrecido.
Vou-te dar a paz que mereces,
Vou realizar o teu último desejo,
Eu não sou mulher de preces,
Mas tu conheces bem todo o meu ensejo.
Não preciso de falar,
Como a maioria das vezes não precisei,
Sabes o que se está a passar,
Sabes tudo, até o que eu ainda não sei.
Nove dias depois,
Finalmente chegarás a casa,
O que virá depois...
Não sei, ninguém diz o que se passa.
Terceira morte sentida,
Três estrelas que tomam conta de mim,
Reúnam-se numa investida
Para que encontre o meu lugar, por fim.
Umas vezes pendo para a direita,
Outras olho para a esquerda,
Pareço um catavento que não se endireita,
Às vezes equaciono se não me tornei lerda...
Nada procuro,
Tudo se atravessa no meu caminho,
O futuro é obscuro
Por isso me recolho no meu ninho.
Às vezes avanço um pouco,
Tento apagar os gritos de medo,
Mas o mundo é sempre louco
E pouco varia no seu enredo.
São as minhas estrelinhas da sorte
Que me guiam e me protegem,
Só aumentam quando chega mais uma morte,
Brilham sempre, mesmo quando não devem.
Hoje o dia é cinzento,
Está da cor da minha vida,
Felizmente não sopra o vento
Que me faria sentir totalmente despida.
Estar forte ou ser forte,
Foi uma questão que me colocaram há dias,
Não sei... talvez tenha tido a sorte
De já ter lidado com demasiadas agonias...
(Mafalda)